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  • Foto do escritorJuliana Couto Melo

Como tratar fissuras de amamentação

Preparar-se para a amamentação durante a gravidez ainda é incomum. E, na maioria da vezes, a construção do que será a amamentação é permeada por uma visão de que esse período é de deleite, praticidade e tranquilidade - visão oriunda de um ideal socializado de que amamentar é prazeroso e natural de se fazer, parte da construção idealizada e romantizada do que é ser mãe. A amamentação não é, porém, um processo tão romantizado assim.





Sim, amamentar é natural. Mas é também um processo atravessado pela cultura. Ao mesmo tempo em que se constrói um ideal de amamentação tranquila, plena e sorridente, a indústria do leite e dos bicos artificiais compra histórias de amamentação nas prateleiras de supermercados e de farmácias. De um lado, é lindo. Do outro, temos a solução se não for lindo.


E, sinceramente, do ponto de vista dessa idealização, não é lindo amamentar. Do ponto de vista real, vivido, é. Lindo e difícil, e complicado, e perpassado pela resiliência - se eu pudesse ousar, diria que a palavra resiliência é facilmente sinônimo de amamentação. Amamentar pede espaço de adaptação, de entendimento, abertura, vontade, disposição, entrega, confiança, empoderamento e informação de qualidade.


O bebê nasce e a amamentação começa?


Por orientação oficial, na primeira hora de vida deve-se promover a amamentação. É papel da assistência ao parto, isso é, todos os profissionais envolvidos na assistência ao nascimento, que o bebê tenha direito de mamar na primeira hora de vida. Os desdobramentos da golden hour ficarão para outro artigo. Neste, falarei das fissuras.


Passou a golden hour, mãe e bebê bem? Alojamento conjunto. Se em casa, será óbvio e prático. Se na maternidade, é preciso que ele aconteça, é recomendação da OMS (Organização Mundial de Saúde) e do MS (Ministério da Saúde), promove vínculo e a amamentação. E começa, então, a saga da fissura? Não.


Porque não, a saga da fissura não começa na apojadura. Ela começa antes, quando não houve orientação adequada, quando essa mulher não se informou/não foi informada de como é a pega do colostro e de como, durante a apojadura, as coisas vão mudar. E a fissura acontece. E pode se repetir em mais de um filho (outro seio, dada a passagem de tempo; outro bebê, outra boca, outro aprendendo).


Apojadura pode ser lido também como caos instalado


É possível senti-lo (o caos) como um furacão, ou ele está adormecido ou está em ebulição. As fissuras são a lava quente. Amamentar com fissuras dói. E muito. As fissuras mamárias acontecem, simplesmente, porque a pega não está adequada - seja pela pega, seja pelo frênulo lingual, seja por alguma alteração cervical. A mulher ainda não sabe como manejar seu seio, como ajustar e pega, organizar o bebê. O bebê ainda não sabe como manejar o seio, ajustar a pega, se organizar. Amamentação é processo, portanto, pede tempo de desenvolvimento (com orientação adequada, é claro).


A fissura acontecendo, o que fazer?


A primeira orientação é: seguir amamentando. Se com dor, com dor; se com sangue, com sangue (não há nenhum problema). É bom amamentar com dor? Não, óbvio. E há modos de buscar curar essa fissura para terminar com a dor o mais rápido possível. Não há aqui apologia a sentir dor amamentando, mas objetividade: até encontrar uma solução plausível à sua realidade pode ser que você precise amamentar sentindo dor. E lidar com a dor. Com vontade de chorar e um bebê no colo. Olá, maternidade real!


Já estou com fissuras mamárias. Para finalizar com essa dor, o que fazer?


Passar leite materno no mamilo: o tratamento úmido para lesões mamilares ajuda a formar uma proteção, contribuindo para a cicatrização mais profunda da epiderme. O leite materno é excelente para esse tratamento. Você pode passar ao fim de cada mamada e até mesmo a cada hora, sempre após as mamadas. Dica: não cobrir de imediato, deixar que seque naturalmente sem nenhum tecido sobre o seio, a fim de evitar que o tecido "grude" sobre essa camada recém-feita. Sabe a superfície de qualquer cicatrização (como um ralado de joelho)? Ela estará ali. Puxou, saiu.


Proteger o mamilo: ficar sem camiseta, fazer dois furos na região do seio em alguma camiseta (que já se tornará uma roupa caseira de amamentar) e/ou utilizar os rolinhos. Os rolinhos são muito úteis e dão um espaço entre o tecido da roupa e o mamilo. Nem todo seio vai se adaptar. Realmente vai variar de mulher para mulher. Como fazer o rolinho: pegue duas fraldas do bebê, torça e depois enrole como uma rosquinha. Encaixe no seio e pronto, rolinho feito.


Laserterapia: são muitas as vantagens do laser de baixa frequência durante a amamentação, mas essa é, de fato, a última recomendação para cicatrização. É preciso custear o atendimento. Traz resultado: a ação é analgésica, acelera a cicatrização e modula o processo inflamatório. A preocupação em usar como último recurso é a tendência de fazer do laser um acessório da amamentação - não é.


Não quero ter fissuras mamárias durante a amamentação. O que fazer?


Está grávida e quer se preparar para a amamentação? Então já saiba, abandone a ideia de esfregar os mamilos e busque se informar...


Informação de qualidade: item 1 de 1 para amamentar. Ler, pesquisar, se informar, buscar boas referências para saber sobre pega adequada, adaptação dos primeiros dias, colostro, apojadura, bicos artificiais, desmame precoce, puerpério, rede de apoio... E muito mais. A lista, aqui, é longa.


Conchas: se ganhou, jogue no lixo; se não, economize seu dinheiro. As conchas não são recomendadas. A concha entra na extensa lista de acessórios dispensáveis e desnecessários. Ganhou ou conhece quem ganhou conchas de amamentação? ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ ONDE A CONCHA ATRAPALHA? 1. Podem permitir a proliferação de fungos na mama da mulher, devido à constante umidade. 2. Além disso, podem pressionar a região, provocar fissuras e ductos entupidos, favorecendo o aparecimento de mastite. ⠀⠀⠀⠀⠀⠀ ⠀⠀⠀ AFINAL DE CONTAS, POR QUE ELA NÃO SERVE? 1. A justificativa para uso da concha é preparar o bico para amamentação, principalmente bico invertido ou plano. 2. Porém, para ser amamentado, o bebê pega a aréola, não o bico. Não faz sentido preparar bico.


Alimentos curativos: chás, cascas e folhas não curam fissuras mamárias e não há evidências que sustentam a eficácia. São fontes de contaminação, já que microorganismos podem provocar uma infecção entrando no corpo da mãe pela fissura. O artigo "Casca de banana: uma possível fonte de infecção no tratamento de fissuras mamilares", por exemplo, traz evidências científicas sobre o uso de casca de banana e conclusões relevantes.⠀ "A avaliação conjunta dos resultados revela a presença de microrganismos potencialmente patogênicos, em níveis capazes de comprometer a qualidade sanitária das cascas de banana testadas. Considerando que os procedimentos utilizados para a redução da carga microbiana não foram eficientes para eliminar os contaminantes presentes - que podem iniciar um processo infeccioso, caso encontrem condições favoráveis - e que as bactérias localizadas na parte externa da casca da banana, com a manipulação, podem facilmente ser transferidas para a parte que entra em contato com as fissuras, é possível que a aplicação da casca de banana no tratamento das fissuras funcione como fonte de microorganismos capazes de iniciar um processo infeccioso".⠀


Absorventes de seio: eles podem ser um foco de umidade recorrente e de infecção. Para usá-los, é preciso ter em mente de sempre trocá-los quando molhados. Imaginem, agora, esses absorventes molhados na apojadura (e de modo estendido, nos primeiros meses), com uma mulher no puerpério, produção se ajustando e se regulando à dupla, com um item que tem validade de uso reduzida. Se há chance de não verificar em intervalos curtos, pode ser um item que vai prejudicar a amamentação.


Caso eu precise acionar um profissional de saúde, quem pode ser?


Fissuras persistentes e recorrentes e dor persistente podem requerer ajuda. Não é recomendado ficar com dor. Se você está considerando buscar orientação profissional, o pediatra, de preferência pró-aleitamento, pode ser aliado. Vale a pena ter como referência uma consultora de amamentação (preferencialmente uma que não trabalhe com bicos artificiais), um quiroprata, se você desconfia de alguma alteração cervical, um fonoaudiólogo pró-aleitamento para avaliação do frênulo lingual e/ou um osteopata, cuja atuação incidirá sobre a mobilização articular do bebê, tratando o corpo em adaptação.


Por Juliana Couto para o Blog da Matrice.




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